Aos irmãos e irmãs das Comunidades Cristãs e a Sociedade,
É com pesar e indignação que tomamos conhecimento de mais uma atrocidade cometida contra trabalhadores rurais ocorrida no último dia 20 de abril na comunidade de Taguaruçu do Norte, área rural do município de Colniza, Diocese de Juína-MT, na qual foram assassinadas brutalmente nove pessoas. Além destes homicídios há pessoas feridas e desaparecidas como resultado da violência que impera na região pela disputa de terras, a ausência do estado e de uma política fundiária injusta e desigual.
Não se trata de um episódio isolado. No último dia 15 de abril, a Comissão Pastoral da Terra, divulgou em seu Relatório Anual de Conflitos no Campo e constatou o aumento de 22% nos assassinatos de populações do campo em função de conflitos agrários no ano de 2016 em comparação com o ano anterior. Isto representa o assassinato de 61 pessoas. Neste relatório fica evidente a omissão do atual governo brasileiro, ao indicar a retirada de recursos ou decretar o fim de programas essenciais para a vida do trabalhador no campo, o corte de recursos dos órgãos fiscalizadores para observar o cumprimento da lei nas demarcações determinadas pela justiça e a explicita retirada de direitos dos trabalhadores do campo, dos povos tradicionais e dos indígenas, através de medidas provisórias como as de número 215 e 759.
Vivemos, como já nos alertou a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, um momento preocupante no qual direitos constitucionais importantes, conquistados duramente pelos trabalhadores, pelos mais pobres e pelos mais fracos estão sendo retirados em nome de uma ordem econômica que privilegia uma minoria e estende à maioria das pessoas, um pesado ônus econômico e social.
O Ensino Social da Igreja condena a posse da terra como direito absoluto, denuncia as insuportáveis injustiças provocadas pela apropriação ilegítima da terra, feita por proprietários ou empresas nacionais e internacionais, às vezes apoiados por organismos do Estado. Pisando sobre todos os direitos adquiridos e, muitas vezes, sobre os títulos legais de posse do solo, tiram a terra dos pequenos agricultores e dos povos indígenas e submetendo-os a forma degradante de dependência e até escravidão. A terra é dom de Deus Pai para todos os seus filhos e filhas, sem exclusão.
A obrigação pastoral da Igreja é testemunhar, com suas ações e escolhas, a prática de Jesus Bom Pastor. É dele que aprendemos a orientação a ser seguida: “Eu vim para que tenham vida, e a tenham em abundância. Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida por suas ovelhas” (Jo 10,1011). Fiel a esta orientação de Jesus Cristo a Igreja não pode e não deve calar-se. Além da dor e da indignação move-nos este pedido de Jesus para que se estenda em toda terra “o seu reino e a sua justiça”. Deste modo, clamamos as autoridades competentes, em todos os níveis, a urgente apuração dos fatos e aplicação da justiça aos responsáveis por esta chacina. Mas, sobretudo insistimos no direito à terra e na vida digna, como direito de todos e não apenas de uns poucos, para que se coloque em pratica o preceito constitucional que prevê que ”a destinação de terras públicas e devolutas será compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária” (art. 188 da Constituição Federal).
Move-nos como igreja, a comunhão e a solidariedade com as famílias enlutadas, com as comunidades e a Diocese de Juina na pessoa de Dom Neri José Tondello. Rogamos ao Deus da vida, para que mantenham viva a fé e a esperança no Ressuscitado que vence a morte e que, não percamos a vitalidade profética da Igreja Samaritana que acolhe os caídos e denuncia toda forma de violência que produz a desigualdade, a injustiça e a morte de inocentes.
Dom Juventino Kestering
Bispo da diocese de Rondonópolis-Guiratinga