“No cristianismo, de fato, mais que em qualquer outra religião, a mulher tem, desde as origens, um estatuto especial de dignidade, do qual o Novo Testamento nos atesta não poucos e não pequenos aspectos (…); aparece com evidência que a mulher é destinada a fazer parte da estrutura viva e operante do cristianismo de modo tão relevante, que talvez ainda não tenham sido enucleadas todas as suas virtualidades“. A frase é do Papa Paulo VI, em 1976. Desde então, a Igreja tem fortalecido aquilo que já se observava nos Evangelhos, num exercício que ganha impulsos até hoje, de forma particular com o Papa Francisco.
Na Igreja no Brasil, são várias as mulheres que fazem parte da “estrutura viva e operante” da ação Evangelizadora, em todos os níveis eclesiais, desde as pequenas comunidades até os altos cargos de coordenação em entidades de incidência nacional. Nesta semana que antecede o Dia Internacional da Mulher, o Portal da CNBB recolheu testemunhos da visão das mulheres sobre sua contribuição na missão da Igreja.
“As mulheres contribuem de forma indispensável na sociedade e nas responsabilidades pastorais. Todavia, a Igreja reconhece que ainda é preciso ampliar os espaços para uma presença feminina mais incisiva na Igreja”, observaram os bispos no Documento 105 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Cristãos Leigos e Leigas na Igreja e na Sociedade, aprovado em 2016.
Em âmbito universal, o Papa Francisco tem motivado a maior participação das mulheres leigas, em virtude do batismo, nas instâncias de responsabilidade da Igreja, “sem cair em clericalismos que anulam o carisma laical”. Também já pontuou que muitas mulheres, impelidas pelo Espírito Santo, mantêm a Igreja de pé, em muitas partes do mundo, com admirável dedicação e fervorosa fé. Mais recentemente, com a carta apostólica Spiritus Domini, Francisco estendeu às mulheres a possibilidade de acesso aos ministérios do leitorado e do acolitado.
“A decisão de conferir estes ofícios, que implicam estabilidade, reconhecimento público e um mandato do bispo, também às mulheres, torna mais eficaz na Igreja a participação de todos na obra de evangelização. «Isto também permite que as mulheres tenham uma incidência real e efetiva na organização, nas decisões mais importantes e na liderança das comunidades, mas sem deixar de o fazer com o estilo próprio da sua marca feminina» (Francisco, Exortação Apostólica Querida Amazonia, n. 103). O “sacerdócio batismal” e o “serviço à comunidade” representam assim os dois pilares sobre os quais se baseia a instituição dos ministérios”, explicou Francisco ao prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.
Confira a partilha de algumas mulheres que atuam na Igreja no Brasil:
Manuela Castro – Assessora de Comunicação da CNBB
Observo a participação cada vez maior das mulheres em todas as instâncias. Na minha experiência pessoal, eu vejo que agora tem um número muito maior de assessoras mulheres nas Comissões da CNBB, comparado aos anos anteriores, e o meu próprio caso, na coordenação da Comunicação: foi escolhida uma mulher e vejo que era isso que eles queriam. Eu vejo uma sensibilização da Presidência para valorização das mulheres, para colocar mulheres em cargos de chefia e a gente vê isso inclusive no Vaticano – o pessoal toma como exemplo o próprio Papa que coloca cada vez mais mulheres nos cargos de chefia lá no Vaticano.
A gente vê que as pastorais e movimentos são dominados por mulheres coordenando. A gente percebe sensivelmente, se acompanhar a evolução de uns anos para cá, a participação cada vez maior das mulheres, não só participação em números, mas a qualidade do trabalho, a valorização e preocupação de incluí-las mesmo.
Carmem Kathia Stolf – coordenadora nacional da Pastoral Familiar
Vejo nós mulheres que atuamos na Pastoral Familiar como uma grande bênção na vida da Igreja. Mulheres de garra, de fé, de entusiasmo e de esperança. E, principalmente, tendo Nossa Senhora, Maria, mãe de Jesus, como modelo de caminhada. Vejo uma grande dedicação e amor à família, um entusiasmo para levar a Palavra de Deus e fazer chegar os projetos de cuidado e esperança às famílias feridas, àquelas que mais precisam. E, com olhar de misericórdia, principalmente nesse ano que vivemos essa pandemia, que nos deixou sem rumo, meio perdidos, por não saber por onde caminhar e como realizar o nosso apostolado.
E o que mais admira nessas mulheres que atuam frente à Pastoral Familiar no Brasil é que, mesmo se dedicando à Pastoral, não deixam a sua primeira missão, a missão de cuidar da sua própria família, a missão de mãe, de esposa, de avó, pois o primeiro apostolado para realizarmos os trabalhos da Pastoral Familiar é dentro da nossa própria família. Os cuidados com os filhos, os netos, os pais idosos, com a mãe acamada, com o filho especial, com o trabalho da casa e o trabalho profissional. E, se não bastasse tudo isso, estão comprometidas com a paróquia, com a diocese, com o Regional, levando a Evangelização e o cuidado às famílias mais carentes e mais sofridas. Mulheres de fibra, mulheres de fé. Que Deus as abençoe por essa grande missão de mulher, que sente a dor dos que mais precisam, mas também se alegram em poder servir como Maria nossa mãe.
Aurenir Paiva – presidente do CNLB Nordeste 4 e secretária adjunta do CNLB Nacional
Ressalto que nós, enquanto mulheres, contribuímos com nossa participação ativa no anúncio e construção do Reino de Deus quando assumimos nossa vocação e missão na vivência dos ensinamentos de Cristo Libertador nas ações do cotidiano, na Igreja e na sociedade. É notável o número de mulheres que assumem a articulação e a organização do CNLB a nível nacional, regional e nas dioceses de todo o Brasil. Percebe-se a conquista da mulher assumindo a ação profética e missionária. E sendo sinal de instrumento de transformação na busca do diálogo constante e da motivação para que cada batizado e batizada seja um instrumento vivo do profetismo de Cristo Libertador, através de seu testemunho autêntico na Igreja e na sociedade.
Karina de Carvalho – Assessora de Comunicação CNBB Sul 2
A atuação e o protagonismo das mulheres na Igreja não é de hoje, vem de longa data, basta a gente observar a caminhada das nossas comunidades, das nossas paróquias a presença das mulheres na pastoral, na animação das comunidades. É sempre mais expressiva que a dos homens, não que seja mais importante, mas elas estão ali, cuidando, no zelo, assumindo o serviço. Isso é de grande importância.
Um grande surpresa foi encontrar o Papa. Eu não sabia o que dizer, só me apresentei, disse que eu era a Karina, que era jornalista e estava acompanhando, fazendo a cobertura da Visita Ad Limina com os bispos. Para minha surpresa, ele tem um jeito com todos, de olhar nos olhos, segurar firme na mão. Ele me olhou e depois olhou para os bispos num sentido de aprovação e disse “que bom, trouxeram uma mulher com vocês”. E comentou ‘podia trazer umas quatro ou cinco”, falou brincando. Foi uma grande alegria e um reconhecimento do Papa, o quanto ele acha importante essa presença da mulher. Senti uma acolhida e uma alegria grande em ter a minha presença ali. Foi um momento muito especial. Isso marca minha vida, marca meu trabalho na Igreja, perceber que hoje sou funcionaria da CNBB Sul 2, mas em primeiro lugar sou uma cristã que vive a sua fé e é uma grande graça você trabalhar e comunicar o que você vive. Para mim, profissão, vida e fé se misturam.
Dorismeire Vasconcelos – liderança leiga da Diocese do Xingu (PA) e auditora no Sínodo para a Amazônia
O Sínodo Especial para Amazônia foi um marco na caminhada das mulheres na Igreja, em especial na Pan Amazônia. Pois em nossa realidade territorial essa presença feminina é forte e é a força que sustenta, articula, mobiliza e faz o agir na missão da Igreja que é o EVANGELIZAR.
[…] Assim com um ser humano precisa do ventre de uma mulher para vim ao mundo. Não há novos caminhos para uma Igreja amazônica e uma ecologia integral sem que a mulher se faça presente e participativa lado a lado como o homem nesse processo. Isso também é sinodalidade, comunhão e unidade. Tudo está interligado.