Dom Darci José Nicioli é mineiro, de Jacutinga. Missionário Redentorista, atuou, por quase duas décadas, como administrador e reitor do Santuário Nacional de Aparecida (SP). O Papa emérito Bento XVI o nomeou bispo auxiliar da terra da Padroeira, em 2012. Semana antes de ser nomeado arcebispo de Diamantina – seu estado natal, em 2016, pelo Papa Francisco, foi eleito, pela Assembleia dos Bispos, presidente da Comissão Episcopal para a Comunicação.
Animado, sorridente, apreciador de uma boa conversa, o arcebispo das terras de Juscelino Kubistchek e de Chica da Silva – sua residência oficial está instalada no antigo casarão do contratador João Fernandes – gosta muito de tratar de assuntos ligados à comunicação e coordenou um trabalho de preparação para o Dia Mundial das Comunicações, celebrado neste domingo, 28 de maio, com muita ansiedade: “Fico entusiasmado ao contemplar o trabalho dos comunicadores da Igreja no Brasil!”.
Dom Darci concedeu entrevista à equipe de assessoria de imprensa da CNBB, via e-mail, na sexta-feira, 26 de maio.
Está chegando hora de celebrar o Dia Mundial das Comunicações. Como o senhor se sente?
Sinto-me profundamente agradecido a Deus por ter me concedido o privilégio de conhecer mais e de acompanhar essa gente boa que lida com comunicação em nome da Igreja no Brasil. Fico entusiasmado ao contemplar o trabalho dos comunicadores! Nestes últimos dois anos, tenho conhecido pessoas e comunidades que atuam na evangelização acolhendo, com empenho, as contribuições do universo moderno da comunicação. Gente corajosa, dedicada, muitas vezes até mesmo disposta ao sacrifício, que usam da criatividade, da tecnologia para fazer com que a pessoa de Jesus Cristo, nosso Redentor, seja conhecida e amada no coração do mundo. Ao se aproximar o dia 28 de maio, Dia Mundial das Comunicações Sociais, fico muito satisfeito com o caminho percorrido até agora pela Comissão Episcopal Pastoral para Comunicação da CNBB. Lá, eu conto com a ajuda constante e o apoio de dom Devair Araújo, bispo auxiliar de São Paulo e dom Roque Souza, auxiliar do Rio de Janeiro; além do trabalho de nossos assessores padre Antônio Xavier e padre Rafael Vieira, que é bastante significativo.
A Comissão animou a preparação para esse Dia Mundial das Comunicações. Quais foram as iniciativas mais importantes nesse tempo?
Em primeiro lugar, colocamos a belíssima mensagem do Papa Francisco para esta ocasião como prioridade da nossa preparação. Desde o lançamento do documento, em 24 de janeiro, não temos feito outra coisa, a não ser insistir, em todo canto, para que leiam, reflitam e apliquem o que o Santo Padre nos ensina nessa mensagem. Nesse esforço, o padre Antônio Xavier, assessor da nossa Comissão, coordenou os trabalhos de preparação, culminando na oferta de um livreto em formato digital, apresentado para auxiliar os agentes da Pastoral da Comunicação. Neste subsídio, oferecemos algumas chaves-de-leitura para a leitura da mensagem do Papa e sugestões para as celebrações.
Tenho visto nas redes sociais, em todo o Brasil, nossos agentes mobilizados e traduzindo o conteúdo da mensagem em iniciativas de estudos, encontros, cafés com a imprensa, cursos e outras modalidades de divulgação. O Papa pede que sejamos criativos e, vejo, que esse apelo tem sido escutado por nossas equipes de trabalho nas dioceses, paróquias e comunidades. Criativos e corajosos! A mensagem deste ano, também, pede que o cristão se dedique a buscar as coisas boas que são “moídas” com as coisas ruins, diariamente, pela comunicação no mundo inteiro.
Uma outra iniciativa, tentamos organizar e realizar, pela segunda vez, uma Romaria de Comunicadores ao Santuário de Aparecida. Fizemos, isso poucos dias depois do lançamento da mensagem do Papa Francisco. Já avaliamos e estamos animados com a possibilidade para a terceira edição dessa romaria, possamos contar com a participação dos bispos referenciais dos regionais e dos coordenadores da Pastoral da Comunicação de todo o Brasil. Estou com muita esperança nesse nosso próximo passo e acredito que poderemos promover um belo encontro dos pastores, coordenadores da comunicação na Igreja do Brasil aos pés da Mãe Aparecida.
O senhor fala muito de Nossa Senhora Aparecida, mesmo depois de ter deixado o trabalho no Santuário e na Arquidiocese de Aparecida. Qual a razão dessa insistência?
O fundador da minha congregação religiosa, bispo e é Doutor da Igreja, chamava Nossa Senhora de “Mãe do Belo Amor”. Em Aparecida, Ela manifestou seu carinho para com os pescadores, escravos e pobres há 300 anos. Desde aquele encontro singelo da imagem enegrecida, Nossa Senhora chama o povo brasileiro para a oração, para a conversão, pedindo que façamos tudo o que Jesus, seu filho, nos disser. Eu amo Nossa Senhora. Gosto muito de Aparecida. Estou hoje conhecendo outras faces bonitas da devoção à Nossa Mãe. Na frente da casa onde eu resido, em Diamantina, há uma belíssima igreja do século 18 dedicada à Nossa Senhora do Carmo.
Nossa arquidiocese de Diamantina, tem 22 paróquias, tendo Nossa Senhora como padroeira: Amparo, Dores, Conceição, Fátima, Graça, Anjos, Livramento, Piedade, Mãe da Igreja, e, claro, Aparecida! Além disso, esse assunto se torna relevante para todo o Brasil, também, pois vivemos no Ano Nacional Mariano. E tem mais: Nossa Senhora é a comunicadora por excelência, porque a Palavra se fez carne em seu ventre! E Ela que a tudo acompanhava na vida de Jesus e da Igreja nascente, meditava tudo no coração! Meditar no coração é atitude indispensável para toda a comunicação cristã!
A comunicação da Igreja no Brasil se expressa bastante pela TV e pelo Rádio. Há várias emissoras espalhadas pelo país. Como o senhor avalia essa comunicação?
Por trás de cada emissora católica de Rádio ou de Televisão há sempre uma ideia ou uma proposta de espiritualidade. Não podemos esquecer isso. Algumas pertencem a fundações constituídas por dioceses e fundações religiosas, outras por fiéis leigos. Há, ainda, emissoras de caráter mais comercial, mantendo com foco a evangelização. Cada uma dessas emissoras traz uma proposta diferente e positiva para o conjunto da comunicação na Igreja. A diversidade que elas apresentam em suas programações é um sinal de riqueza da fé e da liberdade do Espírito que sopra onde quer e como quer. No painel dessas emissoras, aqui e ali, naturalmente pode ocorrer algum tipo de descompasso em relação à orientação do episcopado, do Papa ou até mesmo do Evangelho. Precisamos nos lembrar do que ensina o Papa Francisco: “Somos todos pecadores e todos podemos ser alcançados pela misericórdia divina”.
Eu tenho insistido, nos encontros dos bispos, para que elaboremos algumas orientações mais atualizadas considerando as grandes linhas da ação evangelizadora da Igreja para ajudar as emissoras de Rádio e TV. Esse é um caminho longo, mas já começou a ser feito. Precisamos da oração de todos para o êxito desse projeto. Enquanto isso, estimulamos nossos operadores da comunicação a buscarem, sempre com maior profundidade, a formação a partir dos principais documentos da Igreja nesse campo. As mensagens dos Papas para o Dia Mundial das Comunicações Sociais publicadas, sem interrupção, desde 1967, trazem uma riqueza enorme de conteúdo para nos conservar no caminho da saudável comunicação nos meios de comunicação mantidos pela Igreja.
A comunicação no seu sentido amplo e como realidade da sociedade também tem recebido uma atenção especial da Igreja. No Brasil, o senhor acha que a Comunicação Social tem desempenhado um papel de exemplo como comunicação que opera para o bem do progresso e do entendimento entre as pessoas?
O Brasil é um país maravilhoso. Dizer isso nesses tempos de escândalos de corrupção política parece um pecado. Mas, não é. Eu me refiro às potencialidades de comunicação do povo brasileiro. Somos criativos, competentes, visionários. Formamos aqui verdadeiras escolas de comunicação que influenciam grupos no mundo inteiro. Do ponto de vista técnico, temos uma das melhores expressões de TV do planeta. Não sou eu apenas que digo isso, basta que se faça uma leitura mais aprofundada e essa é constatação com respaldo dos pesquisadores sérios. No campo do rádio não ficamos por baixo. Foi um padre brasileiro que fez parte do começo da história do rádio no mundo: o gaúcho Roberto Landell de Moura.
Agora, é claro que não estou dizendo que o uso feito dessa potência brasileira em comunicação é a melhor do mundo. O predomínio de interesses econômico, por exemplo, colocou-nos numa posição escandalosa de sermos hóspedes de oito a dez conglomerados de comunicação de “propriedade” de poucas famílias no Brasil – o triste monopólio. Eu coloco a palavra entre aspas porque o exercício da radiodifusão é uma concessão pública e ninguém poderia ser considerado dono, uma vez que os concessionários recebem um direito por tempo delimitado e regras muito claras a respeito do uso da concessão.
O uso político, no entanto, é o mais complicado. Acho que os estudiosos de comunicação têm uma palavra clara sobre esse aspecto e não me atrevo a acrescentar. O que ocorre, contudo, que é preciso denunciar todas as formas de cooptação da comunicação pelos interesses de partido, seja qual for. Os meios de comunicação são instrumentos de debate livre dos conteúdos de interesse do bem comum do povo brasileiro e não de grupos ideológicos de qualquer tonalidade.
Uma última coisa: a comunicação veloz e acessível tem nos levado a acompanhar em tempo real uma espantosa sucessão de escândalos políticos. Esse é um mérito da comunicação. E, é em tempos como de hoje que precisamos observar como os meios de comunicação são usados para defender esse ou aquele interesse econômico e político. Está explícito, basta observar.
O Dia Mundial das Comunicações coincide com uma crise política grave em nosso Brasil. O senhor disse, um dia, que era preciso pisar nas “jararacas”. Elas ainda estão à solta?
Sim, estão. Infelizmente. Os fatos investigados de corrupção no Brasil estão mostrando onde elas se escondem. Não podemos perder essa hora de grande importância para o amadurecimento da nossa cidadania. Falo do ponto de vista da comunicação: observemos os discursos feitos, as ações realizadas, o debate público. Podemos nos tornar melhores comunicadores se tirarmos proveito do acompanhamento de momentos tão sérios como o estamos atravessando nos últimos meses no Brasil. Diante do tudo, é hora de reapresentar os valores do Evangelho que nos pedem honestidade, transparência, reto uso do dinheiro público e a defesa constante dos pobres e dos pequenos.
A CNBB nos deu uma orientação extraordinária nos últimos meses e nessa direção tem nos feito ver que, no meio desse furacão, não podemos nos esquecer que o Brasil precisa de ética pública, respeito aos trabalhadores e de diálogo com a sociedade. Essa tem sido a “tecla fixa”: diálogo. As principais reformas que o país tanto precisa, por exemplo, precisam ser elaboradas, discutidas e aprovadas mediante diálogo amplo e com tempo suficiente para o aprofundamento das questões mais complexas.
Uma palavra final?
Sim. Apesar dessa barafunda política, vamos manter viva nossa esperança, pois no coração do cristão não cabe o desespero. Há males que vêm para o bem e, se estes tempos difíceis ajudarem para o crescimento em nossa responsabilidade cidadã, o povo redescobrir a importância da participação política consciente, benditos sejam esses dias difíceis pelos quais estamos passando. Como nos pede o Papa Francisco: “Comuniquemos esperança e confiança no nosso tempo. Coragem, sejamos arautos da Boa Nova!”