Desde o início de seu pontificado, o papa Francisco tem demonstrado uma preocupação especial com a questão dos migrantes e refugiados, estando atento a esta realidade que ganhou dimensões mundiais bastante expressivas, sendo considerada o maior movimento de pessoas, se não de povos, de todos os tempos. Na perspectiva pastoral, visitas, encontros e as tradicionais Mensagens para o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado dão o tom do envolvimento do pontífice que anima a Pastoral da Mobilidade Humana.
Diante o cenário migratório complexo, se apresenta uma natureza forçada de muitos fluxos migratórios contemporâneos. Tal fato aumenta os desafios que se apresentam à comunidade política, à sociedade civil e à Igreja, de acordo com o papa, “exigindo que se responda ainda mais urgentemente a tais desafios de modo coordenado e eficaz”. Para o pontífice, a resposta comum da Igreja poderia articular-se em volta de quatro verbos: acolher, proteger, promover e integrar.
De acordo com a secretária executiva do Setor Pastoral da Mobilidade Humana da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), irmã Claudina Scapini, há “muitos gestos que demonstram que o papa tem esse carinho, essa dedicação” para com migrantes e refugiados, que tem os dias 19 e 20 de junho a eles dedicados respectivamente. O que o papa faz, de acordo com a religiosa scalabriniana é cumprir o que está no Evangelho.
Acolher – O verbo acolher, segundo a fala do papa aos participantes no Fórum Internacional sobre Migrações e Paz, em fevereiro deste ano, apresenta-se perante a “índole da rejeição” como “urgente mudança de atitude para superar a indiferença e antepor aos receios uma generosa atitude de hospitalidade em relação àqueles que batem às nossas portas”. Para o pontífice, é preciso ainda abrir canais humanitários acessíveis e seguros para quantos fogem de guerras e de perseguições terríveis, muitas vezes presos nas garras de organizações criminosas sem escrúpulos. “Um acolhimento responsável e digno destes nossos irmãos e irmãs começa pela sua primeira acomodação em espaços adequados e decentes”, disse Francisco.
Proteger – Trabalhadores migrantes, refugiados, requerentes de asilo e vítimas do tráfico são vulneráveis à exploração, ao abuso e à violência. A estes, deve ser promovida a defesa dos seus direitos inalienáveis, a garantia das suas liberdades fundamentais e o respeito pela sua dignidade. “São tarefas das quais ninguém se pode eximir”, segundo o papa, que elencou algumas ações práticas neste sentido aos participantes do Fórum, entre eles a coordenadora da Pastoral dos Refugiados, irmã Rosita Milesi.
Promover – “Proteger não é suficiente; é necessário promover o desenvolvimento humano integral de migrantes, refugiados e pessoas deslocadas, que ‘tem lugar mediante o cuidado dos bens incomensuráveis da justiça, da paz e da proteção da criação’”, exortou Francisco, que incentiva as comunidades de origem e também aos atores políticos, a sociedade civil, organizações internacionais e instituições religiosas a empreenderem ações coordenadas e promover também o direito “a não ter que migrar”: o direito a encontrar na própria pátria as condições que lhes permitam levar uma existência digna.
Integrar – Como um processo que se baseia no “mútuo reconhecimento da riqueza cultural do outro”, a integração apontada pelo papa Francisco recordando o Magistério da Igreja se faz com “políticas capazes de favorecer e privilegiar as reunificações familiares” e “também programas específicos, que favoreçam o encontro significativo com o próximo”. Também para a comunidade cristã, “a integração pacífica de pessoas de várias culturas é, de certo modo, inclusive um reflexo da sua catolicidade, uma vez que a unidade que não anula as diversidades étnicas e culturais constitui uma dimensão da vida da Igreja que, no Espírito do Pentecostes, está aberta a cada um e deseja abraçar todos”.
Mensagens
Além dos quatro verbos que representam um dever de justiça, de civilização e de solidariedade em relação aos irmãos e às irmãs que, por diferentes motivos, são forçados a deixar a própria terra de origem, as palavras do papa suscitam, desde 2014, sempre no mês de janeiro, reflexões importantes dentro deste contexto.
Em sua primeira mensagem para o “Dia Mundial do migrante e refugiado”, Francisco acentuou que a realidade das migrações, com as dimensões que assume na nossa época de globalização, “precisa ser tratada e gerida de uma maneira nova, justa e eficaz, o que exige, acima de tudo, uma cooperação internacional e um espírito de profunda solidariedade e compaixão”.
No ano seguinte, com o tema “Igreja sem fronteiras, mãe de todos”, o incentivo à cultura do acolhimento e da solidariedade, segundo a qual ninguém deve ser considerado inútil, intruso ou descartável. “A comunidade cristã, se viver efetivamente a sua maternidade, nutre, guia e aponta o caminho, acompanha com paciência, solidariza-se com a oração e as obras de misericórdia”.
Em 2016, no contexto do Ano Santo Extraordinário da Misericórdia, o tema não deixou de estar em sintonia com o Jubileu: “Os emigrantes e refugiados interpelam-nos. A resposta do Evangelho da misericórdia”. Escreveu o papa: “é importante olhar para os emigrantes não somente com base na sua condição de regularidade ou irregularidade, mas sobretudo como pessoas que, tuteladas na sua dignidade, podem contribuir para o bem-estar e o progresso de todos”.
Neste ano, a atenção voltou-se às crianças: “Migrantes de menor idade, vulneráveis e sem voz”. Lembrando das pessoas à procura de trabalho digno ou de melhores condições de vida, dos homens e mulheres, idosos e crianças que são forçados a abandonar as suas casas com a esperança de se salvar e encontrar paz e segurança noutro lugar, Francisco fitou o olhar sobre os menores, que são “os primeiros a pagar o preço oneroso da emigração”. A corrida desenfreada ao lucro rápido e fácil, disse Francisco, traz consigo também “a propagação de chagas aberrantes como o tráfico de crianças, a exploração e o abuso de menores e, em geral, a privação dos direitos inerentes à infância garantidos pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Infância”.
A visita a Lampedusa, as iniciativas e obras no Vaticano relacionadas aos moradores de rua, em boa parte imigrantes, e o pedido para que paróquias e casas religiosas recebessem famílias que chegaram à Europa são gestos que também demonstram o empenho de Francisco em aplicar pessoalmente os quatro verbos.